
Como definir Dave Matthews Band e explicar a sua essência a quem não conhece a banda? Essa é uma das tarefas mais complicadas para quem é fã. E porquê? Porque enquanto uma banda, regra geral, facilmente se insere num género musical, tendo uma ou outra influência de outros géneros, o mesmo não acontece com DMB. Não é rock, não é pop, não é jazz ou funk, não é country, nem muito menos uma das diversas variantes de metal. Contudo, consegue incluir todos esses géneros musicais, colocá-los num “shaker” e transformá-los no seu próprio estilo musical.
Antes de partir para a crítica do que se considera ser, pelo menos pela grande maioria dos fãs, o melhor álbum de originais da carreira da banda, há que fazer referência e apresentar os elementos da banda. A génese da banda tem raízes num bar em Charlottesville, Virginia, onde Dave Matthews, vocalista e guitarrista da banda, era barman e onde LeRoi Moore (saxofonista) costumava tocar com regularidade. Estamos perante um cenário jazzístico, numa cidade que respirava música. Dave Matthews, que compunha somente com uma guitarra acústica, acabou por mostrar as suas canções a Carter Beauford (baterista) e a LeRoi Moore e fundaram, em 1991, a Dave Matthews Band juntamente com um baixista de 16 anos – Stefan Lessard – e com um violinista com formação clássica – Boyd Tinsley. Dezoito anos depois, esta seria ainda a formação existente, não tivesse LeRoi Moore sofrido um acidente de moto4 e falecido em Agosto de 2008. Esta foi uma fase difícil para a banda, mas o concerto de 19 de Agosto de 2008, o dia da morte de LeRoi Moore, demonstra o compromisso da banda não só para com os fãs, não só para com a própria banda, mas principalmente para com a música de LeRoi e para que ela possa perdurar para além da sua vida. Jeff Coffin teve uma tarefa difícil ao substituir LeRoi Moore, mas afastou-se da sombra de LeRoi, diferenciando-se pela postura da que LeRoi adoptava em palco. Actualmente, a banda conta também com a presença constante de um trompetista, Rashawn Ross, e de um guitarrista virtuoso de nome Tim Reynolds.
A Dave Matthews Band conta já com 8 álbuns de originais no seu reportório e, como já foi referido anteriormente, Before These Crowded Streets é aplaudido pelos fãs da banda como sendo o melhor e mais consistente trabalho da banda, a nível de letras e de música. É curioso o facto do álbum mais aplaudido pelos fãs ser também o que é considerado como o mais negro, obscuro e sombrio. Contudo, não deixa de conter momentos de amor e paixão (Crush), alegria (em Stay), de carpe diem (Pig) ou de esperança (The Last Stop Outro). Este álbum é um paradoxo (ou uma antítese se assim preferirmos) em si mesmo pelas temáticas que abrange, pois nele contém a mais bela dedicação de amor escrita pelas mãos de DM em Crush, como contém a mais dolorosa desilusão de amor em Halloween, onde Dave expressa-se vocalmente quase de uma forma grotesca. É também um álbum que conta com diversas participações de artistas como Alanis Morissette, Bélla Fleck (dos Bélla Fleck & the Flecktones), Kronos Quartet, e apresenta diversas interpolações musicais de curta duração assim como as Jam que tanto os caracteriza.
A escrita de DM é uma escrita muito diversificada, divertida no jogo das palavras, crua na expressão dos sentimentos mais obscuros e meiga nos sentimentos mais belos. DM consegue também expor as histórias mais sombrias em estilos de música mais alegres, o que faz com que ouvinte nem sempre se aperceba da essência da história que DM narra (ver o caso de Louisiana Bayou, do álbum Stand Up que narra a história de duas crianças mortas à beira de uma estrada, num ritmo “dançável”).
Relativamente às temáticas musicais no álbum BTCS, temos em Last Stop uma crítica e uma revolta clara às guerras que se travam em nome de um deus: “How is this / Hate so deep / Lead us all so blindly killing killing / Fools we are / If hates the gate to peace / This is the Last Stop”.
Em Don’t Drink The Water, a banda conta com duas participações especiais, com a de Alanis Morissette nas melodias vocais finas e a de Bélla Fleck no banjo, numa música que reflecte sobre a colonização da América e sobre o sangue derramado dos nativos índio-americanos. Novamente, Dave canta de forma agressiva sob o prisma do agressor, ou, neste caso, do colonizador: “Away, away, you have been banished. / Your land is gone, and given to me. / And here I will spread my wings. / Yes, I will call this home. / What’s this you say, you feel a right to remain? / Then stay and I will bury you. / What’s that you say, your fathers spirit still lives in this place? / Well, I will silence you.”
The Last Stop, Halloween, DDTW são possivelmente as músicas mais sombrias do álbum e até da história da banda, pela consciência social que elas apresentam, pelos sentimentos crus e pela forma visceral com que DM transpõe esses sentimentos na sua voz.
The Stone é um objecto enlouquecedor por si só, temos uma harmonia e um sentimento pesado e uma tensão de um lado que logo de seguida é acalmado pelas cordas de Kronos Quartet e pela melodia de Can’t Help Fallin’ in Love de Elvis Presley no saxofone de LeRoi Moore.
A tal consciência social de DM evidencia-se novamente em The Dreaming Tree, sob uma base muito presente da linha de baixo de Stefan Lessard. Nota-se nesta canção uma introspecção sobre o estado actual das coisas e sobre a sua direcção, contrapondo com o que um dia as coisas foram. Pode-se especular sobre o que esta Dreaming Tree pode representar, se é a representação do que gostaríamos que fosse a realidade ou se é o que essa realidade foi outrora. Só para demonstrar a profundidade e beleza lírica desta canção: “Standing here / The old man said to me, / "Long before these crowded streets / Here stood my dreaming tree." / Below it he would sit / For hours at a time / Now progress takes away / What forever took to find / And now he's falling hard / He feels the falling dark / How he longs to be / Beneath his dreaming tree / (…) / A smile of sweetest flowers / Wilted so and soured / Black tears stain the cheeks / That once were so admired / She thinks when she was small / There on her father's knee / How he had promised her, / "You'll always be my baby." / "Daddy come quick, / The dreaming tree has died / I can't find my way home / There is no place to hide
The dreaming tree has died."”
Finalmente, o álbum encerra com Spoon, onde o actor reflecte sobre algo que o faz sofrer e enquanto se tenta aguentar, está no limiar do enlouquecimento pela dor que essa recordação lhe traz. Nem sequer consegue pensar devidamente. Ele faz diálogos consigo mesmo, e as respostas desvanecem-se... No entanto, rir e brincar recalca tudo aquilo que sente e é assim que se processa a sua fuga à dor. “Laughing out loud... / Come now and play...” É o refúgio da sua dor, ele cede à tentação e vai "brincar". Foge do escuro, da dor e faz a ponte para a "closure" do álbum. No final, DM reconforta-nos(-se) em The Last Stop Outro, dizendo “Come in from the cold for a while / Everything will be alright / Come in from the noise for a time / Everything will be alright / Everything will be alright / For now, goodbye, friend, Goodbye”. Este trecho final é como se fosse um conselho que Dave estivesse a dar a si próprio. Depois de algo tão negro, a nível de escrita, que proveio dos seus dedos e da sua mente "perturbada" com todas as temáticas que ele expôs, é como se ele precisasse que se confortar (e até confrontar) e dizer, "espera lá, vai tudo correr bem”, nem tudo é assim tão mau e assim se dá a fecho do álbum, num “closure” consigo mesmo e com os seus fantasmas.
É difícil para quem respira DMB conseguir classificar um álbum desta banda, quanto mais sendo o que é considerado quase por unanimidade o melhor e mais ecléctico da sua carreira. Contudo, aqui fica a classificação, com o conselho de ouvirem-no com atenção a todos os detalhes e paradoxos que nele existem.
Análise efectuada por Inês Ventura
Tracklist:
1. Pantala Naga Pampa
2. Rapunzel
3. The Last Stop
4. Don't Drink The Water
5. Stay (Wasting Time)
6. Halloween
7. The Stone
8. Crush
9. The Dreaming Tree
10. Pig
11. Spoon
Músicas em Destaque:
Todas. Não vale a pena destacar nenhuma.
Nota Final (1/20):
19
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